sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Espinhela Quebrada



Neguinho tá preocupado com espinhela caída. Li dois artigos assinados por médicos e, coincidência ou não, os dois diziam que os médicos estrangeiros iriam chegar ao Brasil sem saber o que é espinhela caída. “Que sientes?” – perguntará o doutor. “Espinhela caída” – responderá o caboclo das brenhas. Pronto. Danou-se tudo.
Dr. Antônio Carlos Lopes, diretor da Escola Paulista de Medicina, disse no programa Entre aspas, da Globo News, que as faculdades privadas de medicina estão formando médicos especialistas que não sabem tratar nem gripe, quanto mais diarreia. “E espinhela caída?” – perguntaria Tia Zulmira, tia do Stanislaw Ponte Preta.
Faz tempo que não se vê ninguém preocupado com esses médicos brasileiros, aos quais se referiu Dr. Lopes, que não sabem tratar gripe nem diarreia. Na pauta, agora, só médico estrangeiro (cubano, sobretudo, apesar de não ser maioria entre os inscritos). E o Revalida, exame para validar diploma de estrangeiro. Exame para avaliar médico brasileiro que não sabe tratar caganeira, disso não se fala mais.
Pra ser advogado, após cinco anos de faculdade, o cara tem que fazer o exame da OAB. Se não passar, créu! E mais de 90% dos alunos das faculdades privadas levam pau. Advogar que é bom, necas.
Agora, quem faz seis anos de medicina é médico no dia seguinte. E, mesmo que não saiba tratar nem gripe, sai por aí clinicando e operando. Aliás, não sai, fica. Nas capitais e grandes cidades.
Alguns Conselhos Regionais de Medicina fazem exame de avaliação dos formandos por fazer. Pra constar. Nem obrigatórios são; faz quem quer. Diz Dr. Lopes: “os exames têm efeito apenas estatístico, não têm validade para impedir o indivíduo de exercer a medicina”.
Mas, o que não falta, mesmo, é neguinho pra esculhambar a medicina cubana, como se fosse essa a questão. “É quinto mundo”, dizem. Porém (“ai, porém”, como canta Paulinho da Viola), mesmo com todo o miserê da ilha, morrem menos crianças lá do que na maior economia do mundo: 4,6 por mil nascidos, contra sete nos Estados Unidos, até o primeiro ano de vida. E 16 no Brasil (eram 28,4 em 2002). Segundo a Unicef, gente boa.
Daqui, do rés do chão, dou meus pitacos sobre a contratação de médicos estrangeiros, saúde pública e outros que tais.
Ponto um. Há muito, não é de agora, acho que quem estuda em faculdade pública, qualquer uma, contrai um débito para com a sociedade. Formado, tem que pagar. Com grana ou trabalho. O que não tá certo é um cara se formar em medicina numa escola pública e, no dia seguinte, estar numa clínica particular, removendo com raio laser tatuagem de babaca arrependido. Pra isso, não precisa ser médico. Basta ser técnico. E ler o manual do fabricante. Ou estudar numa faculdade privada. Pública, não!
Ponto dois. Contratação prioritária de médicos brasileiros. Ponto três. Para as vagas não preenchidas, sob condições rígidas e pré-estabelecidas, contratação de médicos estrangeiros para atuação exclusiva em áreas carentes de médicos, periferia e interior. Submetidos ao Revalida, claro. E sabendo português. Inclusive, o que é espinhela caída (coisa que um bom glossário resolve).
Já imaginou um doutorzinho recém-formado numa dessas faculdades brasileiras, às quais se referiu Dr. Lopes, fazendo ambulatório numa cidadezinha nos cafundós do Judas? “Dotô, tô com uma dô na boca do estômbago e no espinhaço, uma canseira da bixiga lixa. Já fiz de tudo. Reza de esconjuro com gaio de arruda e oração em latim.” “Estômbago”, talvez, o doutorzinho desconfie o que seja. Mas “espinhaço” e “canseira da bixiga da lixa”, duvido. E “reza de esconjuro”?
A propósito: pelos sintomas, esse paciente  está com espinhela caída.
 
Joca Souza Leão

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