domingo, 17 de novembro de 2013

A arte de sorrir

DENIS CAVALCANTE

Entro no restaurante, subo e desço no elevador, vou a recepções, vernisages, festas. E o que vejo: pessoas de cara amarrada, de mal com a vida, de mal com o mundo. Pessoas bem postas, bem nascidas, com tudo que qualquer ser humano almejou um dia na vida: dinheiro á larga, carros importados do ano, viagens protocolares agendadas com antecedência na primeira classe ao exterior, jóias “á la vonte”, sapatos italianos, bolsas Louis Vuitton, Fendi, para o diário Victor Hugo, ( se seu homônimo soubesse, que ia virar grife de bolsa de madame, levantaria do túmulo ), mulheres nos trinques, maridos bem sucedidos; e vice-versa. Sorrir que é bom: neca, neca, só conversa. Não receber sequer um Bom Dia! Como vai? E aí? É dose pra leão! É ruim á beça!
Uns novo ricos, outros ricos-pobres, contas bancárias com cifras astronômicas, se morassem em Sampa, quatrocentões graças a Deus, e seqüestráveis com certeza. E com tudo isso andam por aí de cara amarrada negando um sorriso para o vizinho, porteiro, motorista, empregado (a). Me pergunto, meu Deus, porque?
“Enquanto escrevo, ouço “Smile” cantada pelo incomparável Tony Bennett. Divago tentando entender... Seria o aparecimento do Euro? A alta ou a queda do dólar? Talvez o concorrente que ganhou mais um novo cliente? O sócio comprou um apartamento triplex? Ou quem sabe a montadora do carro importado mudou o modelo, a frente, a traseira, o formato dos faróis sem lhe avisar? Ou talvez a “amiga” comprou um tubinho preto, uma bolsa igual e foi a mesma festa? Fala sério...
E, enquanto isso o pobre sorri, mesmo sem motivo, sem festa; sorriso banguela, caninos á mostra, como se houvesse motivo, houvesse festa. Sorri apesar do irremediável preço dos remédios, do ônibus lotado, do barraco mal cuidado, do salário apertado, dos filhos largados... talvez seu único prazer é o de ligar a TV, e assistir quando dá, a novela das oito; e agora o Big Brother. Onde, por sinal a grande maioria dos participantes são classe média alta, modelos, bonitos, tem onde morar, família torcendo a esperar, nada a perder, tudo a ganhar. Pasmem leitores: tem até uma participante que se deu ao luxo de gastar $4000.00 dólares ou seriam reais?, em lingerie. É mole! E mesmo assim o coitado sorri.
E os arrogantes a nos negar um simples e reconfortante sorriso. Ah, não! Os chefes e patrões a esbravejar ordens a torto e a direito, destilando seu mau humor, como fel para todos os lados. Não que não existam pobres amargos, mau humorados, mas esses pelo menos tem um motivo. Mas a nata, a fina flor... tenham a santa paciência!
Juro que não sou hipócrita: lutei e luto para dar o melhor para minha prole, mas, se, para isso tiver que perder meu bom humor, passar como um trator por cima dos outros, aflorar minha soberba, deixar de lado minha alegria de estar vivo, viver... prefiro voltar no tempo, e recomeçar do zero, recomeçar tudo de novo..
Aí vou ao supermercado, encho o carro de sacolas de compras, e , como é de praxe, o carregador solícito, me segue empurrando o carrinho até o carro. Arruma metódica e criteriosamente as sacolas no porta-malas do veículo. E quando termina, espera é lógico, o troco, a merreca, a recompensa. E eu desprovido de numerário trocado, pra falar a verdade, numerário algum. ( paguei de cartão, como fazem quase todos hoje em dia, ricos, remediados e pobres, olha a milhagem! ). Dou a resposta protocolar: - Meu filho, fica pra próxima, hoje nada tenho. E como resposta, um sorriso de piano estampado no rosto: - tem poblema não dotôr, na próxima o senhor me dá dobrado. Valeu!
Eis o x da questão: Quem muito fácil ganha, muito amealha, muito quer, muito tem, sequer se digna a dar Bom Dia, Boa tarde, Boa Noite, Muito Obrigado, não há de quê... Esquece de sorrir, esquece de sonhar, esquece que a vida existe, é curta, e que foi feita prá viver.
e



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