Folha - As manifestações deixaram jornalistas, sociólogos e governantes
perplexos. E a senhora, ficou espantada?
Dilma Rousseff - No discurso que fiz na comemoração dos dez anos do
PT, em SP [em maio], eu já dizia que ninguém, ninguém, quando conquista
direitos, quer voltar para trás. Democracia gera desejo de mais democracia.
Inclusão social exige mais inclusão. Quando a gente, nesses dez anos [de governo
do PT], cria condições para milhões de brasileiros ascenderem, eles vão exigir
mais. Tivemos uma inclusão quantitativa. Esta aceleração não se deu na qualidade
dos serviços públicos. Agora temos de responder também aceleradamente a essas
questões.
Mas a senhora não ficou assustada com os protestos?
Não. Como as
coisas aconteceram de forma muito rápida, eu acho que todo mundo teve
inicialmente uma reação emocional muito forte com a violência [policial],
principalmente com a imagem daquela jornalista da Folha [Giuliana Vallone] com o
olho furado [por uma bala de borracha]. Foi chocante. Eu tenho neurose com olho.
Já aguentei várias coisas na vida. Não sei se aguentaria a cegueira.
Se não fosse presidente, teria ido numa passeata?
Com 65 anos, eu
não iria [risos]. Fui a muita passeata, até os 30, 40 anos. Depois disso, você
olha o mundo de outro jeito. Sabe que manifestações são muito importantes, mas
cada um dá a sua contribuição onde é mais capaz.
O prefeito Fernando Haddad diz que, conhecendo o perfil conservador do
Brasil, muitos se preocupam com o rumo que tudo pode tomar.
Eu não acho
que o Brasil tem perfil conservador. O povo é lúcido e faz as mudanças de forma
constante e cautelosa. Tem um lado de avanço e um lado de conservação. Já me
deram o seguinte exemplo: é como um elefante, que vai levantando uma perna de
cada vez [risos]. Mas é uma pernona que vai e "poing", coloca lá na frente. Aí
levanta a outra. Não galopa como um cavalo. Aí uma pessoa disse: "É, mas tem
hora em que ele vira um urso bailarino". Você pode achar que contém a mudança em
limites conservadores. Não é verdade. Tem hora em que o povo brasileiro aposta.
E aposta pesado.
A senhora teve uma queda grande nas pesquisas.
Não comento
pesquisa. Nem quando sobe nem quando desce [puxa a pálpebra inferior com o
dedo]. Eu presto atenção. E sei perfeitamente que tudo o que sobe desce, e tudo
o que desce sobe.
Mas isso fez ressurgir o movimento "Volta, Lula" em 2014.
Querida,
olha, vou te falar uma coisa: eu e o Lula somos indissociáveis. Então esse tipo
de coisa, entre nós, não gruda, não cola. Agora, falar volta Lula e tal... Eu
acho que o Lula não vai voltar porque ele não foi. Ele não saiu. Ele disse outro
dia: "Vou morrer fazendo política. Podem fazer o que quiser. Vou estar velhinho
e fazendo política".
Para a Presidência ele não volta nunca mais?
Isso eu não sei,
querida. Isso eu não sei.
Ao menos não em 2014.
Esses problemas de sucessão, eu não discuto.
Quem não é presidente é que tem que ficar discutindo isso. Agora, eu sou
presidente, vou discutir? Eu, não.
Mas o Lula lançou a senhora.
Ele pode lançar, uai.
O fato de usarem o Lula para criticá-la não a incomoda?
Querida,
não me incomoda nem um pouquinho. Eu tenho uma relação com o Lula que tá por
cima de todas essas pessoas. Não passa por elas, entendeu? Eu tô misturada com o
governo dele total. Nós ficamos juntos todos os santos dias, do dia 21 de junho
de 2005 [quando ela assumiu a Casa Civil] até ele sair do governo. Temos uma
relação de compreensão imediata sobre uma porção de coisas.
Mas ele teria criticado suas reações às manifestações.
Minha
querida, ele vivia me criticando. Isso não é novo [risos]. E eu criticava ele.
Quer dizer, ele era presidente. Eu não criticava. Eu me queixava, lamentava
[risos].
Como a senhora vê um empresário como Emílio Odebrecht falar que quer que o
Lula volte com Eduardo Campos de vice?
Uai, ótimo para ele. Vivemos numa
democracia. Se ele disse isso, é porque ele quer isso.
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