- 17/09
Depois das grandes manifestações de junho, com sua revolta
explosiva capaz de colocar em chamas o Palácio Itamaraty e levar mais de um
milhão e meio de pessoas às ruas, tudo pode parecer calmo.
A dimensão
reduzida das manifestações do Sete de Setembro parece corroborar tal visão, o
que leva a classe política a passar ao ataque e procurar aprovar leis que
restrinjam manifestantes que escondam o rosto, que puna com até oito anos de
prisão degradação de patrimônio em contextos de revoltas políticas, entre outras
pérolas.
Mesmo os debates políti- cos parecem, cada vez mais,
restringirem-se à descrição da ciranda de acordos par- tidários a fim de
viabilizar candidaturas.
No entanto a primeira li- ção a tirar de junho é
a se- guinte: a política brasileira transformou-se em algo profundamente
instável. Nada nos garante que não estamos vendo apenas um momento de calmaria
antes de uma nova tempestade. Note-se como, desde junho, este país viveu, de
maneira praticamente ininterrupta, em um estado contínuo de manifestações de
toda ordem.
A maioria delas é ligada a pautas como desmilitarização da
polícia, melhores condições para professores, indignação contra a corrupção no
Metrô de São Paulo, entre tantas outras. Isso é um sintoma importante de uma
inquietude na política brasileira, que talvez não passará até que novos atores
políticos se constituam.
Por um momento, parecia que certas instituições
brasileiras tinham sentido o golpe. O Congresso Nacional votou leis que estavam
engavetadas há anos, a Polícia Militar sentiu-se acuada em sua barbárie, os
partidos prometeram ouvir mais os setores que exigiam mudanças estruturais. Tudo
isso durou um instante. Logo em seguida, tais instituições demonstraram seu
caráter radicalmente irredutível em relação a reformas e voltaram a operar como
sempre operaram.
Esse é um modelo de lógica de avestruz que apenas
acelera o desabamento. Nada mais equivocado do que confiar em uma calmaria
aparente.
Quando uma sociedade acorda, ela não volta a dormir
completamente. Na verdade, sua elaboração passa a um estado de
latência.
Em latência, ela vai aos poucos se desacostumando de suas
antigas formas, até que chega o momento em que provocar mudanças equivale a
chutar uma porta podre.
Muitas das transformações fundamentais ocorrem
as- sim, ou seja, o trabalho mais importante foi feito em silêncio
aparente.
Como dizia T. S. Eliot, essa é a forma com que o mundo termina:
não com um estrondo, mas com um lamento silencioso.
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